quarta-feira, 30 de novembro de 2022

Contexto do surgimento do Bitcoin

A crise de 2008 ainda traz debates sobre quais foram suas reais causas. Algumas das apontadas são a falência do Banco Lehman Brothers em setembro de 2008, ocasionada por ganância, desregulamentação do setor financeiro, excessos do bancos são exemplos de causas apontadas.

Isso porque, no final do século XX, os bancos emprestavam dinheiro de forma praticamente indiscriminada, fornecendo empréstimos mesmo para pessoas que claramente não poderiam arcar com seu ressarcimento. As garantias para esses empréstimos eram ativos questionáveis, de pouca liquidez. 

Esse hábito contumaz repetido à exaustão durante anos fez com que a insolvência fosse inevitável. Esse foi o motivo da falência de vários bancos nessa época. E, para conter a sangria bancária, diversos bancos centrais pelo mundo optaram por simplesmente imprimir dinheiro. Obviamente esta expansão monetária, por não ter sido acompanhada de crescimento proporcional do mercado, acaba por se refletir em perda do valor da moeda e inflação

Concomitantemente à essa crise, surge a figura anônima fundadora do Bitcoin, Satoshi Nakamoto, que propõe um sistema de pagamentos e de dinheiro eletrônico independentes do sistema financeiro tradicional, e, portanto, independente de decisões irresponsáveis dos entes centralizadores desses sistemas.

O Bitcoin combina criptografia, sistemas distribuídos e teoria dos jogos em uma plataforma cujo propósito está além de apenas representar dinheiro eletronicamente. A grande inovação por trás dessa plataforma está no fato de que ele permite que o problema do gasto em duplicidade seja resolvido sem que uma instituição intermediária, “de confiança”, inserida no processo. É uma grande inovação que levou a humanidade a ter uma alternativa em direção à plena liberdade financeira.


Paula Cristina Laun

Gerente de Projetos
Dataprisma Comunicação Interativa - Blumenau

domingo, 5 de junho de 2022

Conceito e Funcionamento do Blockchain

O Blockchain foi concebido como resposta a um grande problema relacionado à comprovação de autenticidade de transações em ambientes online, como a Internet. Ele veio trazer segurança e transparência a diversos tipos de transações onde a comprovação de autenticidade e titularidade são imprescindíveis para que essas transações sejam consideradas inquestionavelmente autênticas, tendo, dessa forma, aceitação ampla.

Ele nada mais é que um grande banco de dados, um livro-razão inviolável via algoritmo de verificação e onde praticamente qualquer coisa de valor pode ser inserida, rastreada e negociada. Seu conceito é inspirado no Ledger, livro-razão cujos cálculos nele presentes contém um cálculo matemático - ou um algoritmo - que comprova que cada cálculo nele escrito é legítimo. Isso impede que alguém faça uma alteração nesse livro razão sem ser percebido, tornando as informações ali escritas de autenticidade comprovável.

Para ser um banco de dados inviolável, o Blockchain conta com tecnologias que validam e repassam o registro de eventos, de forma a garantir a transparência das transações nele realizadas. 

As seguintes tecnologias são essenciais para o funcionamento do Blockchain:

1. Banco de dados P2P: Trata-se de um banco de dados replicado através de uma rede Peer to Peer (Ponto a ponto - P2P) onde todos os nós componentes da rede espelham o mesmo banco de dados. Isso dificulta alterações, uma vez que para que tal alteração precisaria ser feita ao mesmo tempo, em todos os nós da rede. Caso a arquitetura do Bitcoin fosse centralizada, como em uma arquitetura de rede cliente/servidor, onde existe a centralização dos dados em apenas um local, tal alteração indevida seria mais viável. 

Por ser P2P, a arquitetura Blockchain é denominada descentralizada e sua tecnologia é colaborativa. As informações dentro do Blockchain são organizadas em blocos, e cada bloco é encadeado ao anterior. É essa organização que dá nome à tecnologia (Blockchain = corrente de blocos, em tradução livre). Esses blocos, inicialmente gerados em nós individuais, passam por um processo de validação descrito adiante como "algoritmo de consenso" para serem efetivamente integralizados à rede Blockchain e replicados como parte dele, para todos os nós, sem a necessidade de terceiros para conferir as transações realizadas.

Caso uma informação mude dentro do bloco, isso vai precisar detonar uma alteração em cascata em todos os blocos subsequentes a ele para que tenha integridade, uma vez que cada bloco faz referência ao anterior. 

2. Criptografia: é a técnica para transformar a informação em algo ilegível a quem não tiver a chave para descriptografar a informação. No Blockchain, cada linha horizontal de transações é criptografada em chave de 128 bits, ou seja, a informação de cada linha é embaralhada e mascarada em 128bits.

3. Hash: cada linha criptografada recebe, no seu final, um código hash, que é uma espécie de impressão digital ou identificador exclusivo. Ele é o resultado de um cálculo matemático/algoritmo que faz o somatório de todas as informações da transação. Esse código é diferente para cada informação. A alteração de um dígito, por exemplo, faz com que o hash resultante seja outro. 

4. Assinatura digital: é a garantia de autenticidade, de que quem está assinando aquele documento é realmente a pessoa que tem autorização para acesso àquele nó.  É o resultado de processamento eletrônico de dados de objetivo individual para conhecer a autoria de um documento eletrônico.

5. Algoritmos de consenso: Para garantir que as informações inputadas sejam consistentes, e replicá-las para todas as estações (nós) de sua rede, o Blockchain utiliza algoritmos de consenso.  Isso porque as informações novas vão sendo geradas e armazenadas de forma dispersa. De tempos em tempos é necessário compilar todas essas transações que foram executadas e gerar uma única base de dados. Nesse momento o Blockchain lança um desafio na rede, um algoritmo a ser descoberto. Nesse momento, todos os nós que compõem a rede Blockchain irão tentar decifrar esse desafio. O nó vencedor mais rápido vai ser escolhido, então, como estação mineradora. É ela que vai replicar as informações para todas as demais estações que pertencem à topologia Blockchain. Cada plataforma tem o seu algoritmo de consenso. O Bitcoin, por exemplo, trabalha com o Proof of Work,  já o Ethereum trabalha com o Proof of Stake.

Aplicação na área financeira - criptomoedas

Satoshi Nakamoto desenvolveu a ideia do Bitcoin, primeira e principal criptomoeda descentralizada e à prova de falsificações / duplicações indevidas, durante uma crise econômica de nível global – puxada pela grande crise de 2008 nos Estados Unidos. 

Seguindo todo o princípio do funcionamento do Blockchain descrito anteriormente, os conteúdos das transações em criptomoedas são protegidos e guardados nesse  sistema de alta segurança. 

Vantagens:

- Serem descentralizadas, com sua transferência feita de maneira direta, sem intermediários como bancos ou instituições reguladoras;

- Não serem fiscalizadas por governos, uma vez que funcionam de independente e criptografada - sendo de decodificação impossível pelos computadores existentes atualmente;

- Viabilizarem transações criptografadas diretas, sem intermediários, entre as partes que o utilizam;

- Serem verificáveis como autênticas;

- Estarem presentes no registro histórico de transações e validação destas. Isso significa menos conflitos;

- Possibilitarem a redução da complexidade da escrita de contratos (rede Ethereum é a principal para esse tipo de algoritmo). Os contratos inteligentes implantados nas plataformas são capazes de reduzir tempo e custo de transações.

Desvantagens:

- Como esses sistemas fazem registros descentralizados, em múltiplos pontos e não lineares, isso aumenta o tempo e complexidade desses registros. Assinatura digital, por exemplo, é realizada em toda a rede de forma paralela. Essa quantidade de  registros, algoritmos, criptografia e assinaturas sobrecarrega o sistema, com instabilidade e dificuldade de acesso.

- A depender da plataforma, as taxas de mineração podem ser representativos para adoção em larga escala.

- A adoção de algumas aplicações práticas do Blockchain pode ser limitada pela falta de interesse de players do mercado financeiro tradicional, por conflito de interesse. Isso porque, ao popularizar o uso do Blockchain e trazer para o dia a dia dos clientes as facilidades do Blockchain, eles acabam desmistificando-o, abrindo portas para que outros serviços baseados em Blockchain tenham melhor aceitação e que isso por fim venha a diminuir ou mesmo eliminar a importância do setor bancário tradicional para a economia. 

Paula Cristina Laun
Gerente de Projetos
Dataprisma Comunicação Interativa - Blumenau

Análise de discurso - Martin Luther King - I have a dream

 



A crescente tensão racial das décadas de 50 e 60, advinda de inúmeros conflitos causados pelo desejo de igualdade da comunidade americana negra, martirizada pelo racismo profundamente enraizado, faz com que surjam grandes líderes pelos direitos civis. O mais representativo nome deles é Martin Luther King, que forjou sua liderança inspirado em conceitos como a desobediência civil e a não-violência, bastante em voga por conta da popularidade de Mahatma Ghandi à época.

Martin Luther encabeça diversos protestos pacíficos, sendo o historicamente mais representativo chamado de "A Marcha de Washington", que arrasta multidão estimada em torno de 250 mil pessoas. É dentro deste contexto de ebulição pela igualdade racial que Martin Luther declama seu discurso "I have a dream" - Eu tenho um sonho.

Performance do orador


Dotado de uma autoconfiança inabalável, Martin Luther domina a arte de falar bem - qualidade imprescindível para que se tenha excelente oratória, com textos verbalizados em crescentes de eloquência perfeitamente casados com o desdobramento emocional também crescente do significado de seu texto. Conforme  cada linha de raciocínio se aproxima de sua conclusão, mais  a entonação fica forte, reforçando o significado do que ele comunica. Além disso, sua perfeita dicção e pronúncia contribuem para que não haja prejuízos ao entendimento.

O texto declamado é conciso e coerente, com excelente continuidade, progressão e articulação, sem contradições, o que facilita sua assimilação. Martin Luther tem pleno domínio linguístico, com uso correto de recursos gramaticais, palavras e expressões e linguagem formal, para reforço de sua autoridade sobre o tema. Além disso, seu domínio pragmático e extralinguístico é excelente, já que ele é hábil em relacionar o contexto ao texto.

Sobre a expressão corporal de Martin Luther, pode-se observar que ele se mantém em postura ereta, com cabeça erguida, trajado com terno e gravata - código de vestimenta que o identificava como sendo letrado e culto – ou seja, transparecendo através do código não-verbal um reforço do significado do texto oral: ele quer poder andar de cabeça erguida, poder ser tratado de igual para igual, com plena autoestima por ser o que é. Com essa postura e com essa vestimenta ele diz: "eu sou igual, eu não sou menor".

Formação do vínculo

Martin Luther lidera uma manifestação e declama um discurso em que ele tem lugar de fala e aparenta estar plenamente convicto do que diz; ele é tão afetado pelo racismo quanto qualquer um dos que ouvem seu discurso. Essa estreita relação  permite a criação do sentimento de empatia entre receptor e emissor. Essa formação de vínculo é intencionalmente reforçada quando Martin Luther intitula seus receptores como "meus amigos", ou seja, "meus iguais". Com esse forte canal de identificação emocional aberto e reforçado, fica muito mais fácil absorver com intensidade cada palavra dita por Martin Luther, como se aquele texto tivesse sido escrito exclusivamente para cada um. 

Diante de sua vivência  e de seu entendimento profundo sobre a verdade do que está verbalizando, ele consegue transparecer grande convicção, o que ajuda o público a entender que aquilo que está sendo dito é uma verdade inquestionável

Para extrapolar a esfera de seu estrato social e atingir um público ainda mais amplo, que precisa também ser tocado pela ideia da igualdade defendida ali, ele busca comparar o sonho da igualdade racial ao próprio sonho americano, o sonho que todo americano sonha - seja ele branco ou negro. 

Através de um encadeamento lógico espetacular, Martin Luther prova que o sonho americano só pode ser verdade caso o sonho da igualdade racial antes seja tornado realidade. E ele toma o cuidado de não hostilizar a parte então dominadora da sociedade; ele busca citá-la em diversos pontos do discurso como igual: à mesa, de mãos dadas, frequentando os mesmos locais. Ele busca separar o racismo do racista, utilizando a linha de raciocínio de que se deve culpar o pecado, não o pecador

Mensagem

Martin Luther trabalha de forma genial o antagonismo entre a situação atual que aquele público vivencia - o "hoje", a "realidade" de extrema discriminação - com o desejo inato que todo ser humano tem de viver em paz, de ser reconhecido como um igual, de poder viver em um ambiente de justiça social e racial - o "amanhã", o "sonho". 

Ao iniciar cada novo tópico do discurso pela célebre frase "Eu tenho um sonho", o canal de empatia ali aberto fez com que todos os ouvintes acabem por sentir que têm o mesmo sonho. Assim, o sonho de Martin Luther revela-se ser o sonho de todos. Essa forma de comunicar faz com que seu discurso seja muito mais envolvente, e, por consequência, mais persuasivo.

Figuras de linguagem

Ele se utiliza diversas figuras de linguagem para enriquecer o significado de sua mensagem, fazendo com que seu texto dialogue com o emocional de cada ouvinte, o que possibilita a formação de significados imensamante maiores do que se o texto fosse planejado para ser uma mera comunicação de fatos. Algumas figuras de linguagem identificadas:

1. Metáforas

Grande parte do texto é baseado em metáforas. E não por acaso; através de metáforas, o significado do texto é expandido para a interpretação emocional, muito particular de cada receptor. Algumas delas:
- Mesa da fraternidade;
- Calor da injustiça;
- Montanha do desespero;
- Pedra de esperança;
- Lábios gotejando palavras de intervenção e negação;
- Sino da liberdade.

2 Antíteses metafóricas

Para trazer ênfase ao que está errado e como deve ser o acerto. É o que ocorre nos seguintes trechos:
-  Um dia todo vale será exaltado, e todas as colinas e montanhas virão abaixo;
- Os lugares ásperos serão aplainados;
- Os lugares tortuosos serão endireitados;
- Cortar da montanha do desespero uma pedra de esperança;
- Transformar as discórdias estridentes de nossa nação em uma bela sinfonia de fraternidade.

3. Eufemismos

Como "Transpirar com o calor da opressão" no lugar de discorrer sobre os crimes que aconteceram no Mississipi.

4. Catacreses

Como em "Oásis" para representar um local bom.

Recursos de construção / sintaxe

Recursos de construção / sintaxe usados por Martin Luther e que corroboram o melhor entendimento do texto:

1. Gradação

progressões em forma crescente, como em "Quando nós permitirmos o sino da liberdade soar, quando nós deixarmos ele soar em toda moradia e todo vilarejo, em todo estado e em toda cidade, nós poderemos acelerar aquele dia"

2. Pleonasmo

Repetições intencionais realizadas com as seguintes palavras / expressões:
Sonho: em diversos pontos do discurso e uso de termos redundantes como "racistas malignos".
- Meninos/meninas: no trecho da frase "meninos negros e meninas negras poderão se unir as mãos com meninos brancos e meninas brancas como irmãs e irmãos", que  reforçam a igualdade e o vínculo entre eles.
- Juntos: em "nós poderemos trabalhar juntos, rezar juntos, lutar juntos, para ir para a cadeia juntos, defender liberdade juntos, rezar juntos, lutar juntos" para reforçar sua intenção de unificar o país;
- Ouvirei sino da liberdade: para sinalizar que seu sonho é que o país inteiro seja um país livre em "E assim ouvirei o sino da liberdade no extraordinário topo da montanha de New Hampshire. Ouvirei o sino da liberdade nas poderosas montanhas de Nova York. Ouvirei o sino da liberdade nos engrandecidos Alleghenies da Pennsylvania. Ouvirei o sino da liberdade nas ladeiras curvas da Califórnia. Ouvirei o sino da liberdade na Montanha de Pedra da Geórgia. Ouvirei o sino da liberdade na Montanha de Vigilância do Tennessee. Ouvirei o sino da liberdade em todas as colinas do Mississipi. Em todas as montanhas, ouvirei o sino da liberdade.".
- Livre/Afinal: quando Martin Luther conclui seu discurso com um fecho vitorioso, ele ali utiliza-se novamente do pleonasmo e também da metalinguagem, já que no final do texto, ele além de repetir “livre” – ser livre é o grande objetivo do discurso e ali isso é enfatizado - ele também repete intencionalmente “afinal”, repetição essa que reforça o momento final de seu discurso, além, é claro, de estar falando de um objetivo final: "Livre afinal, livre afinal. Agradeço ao Deus todo-poderoso, nós somos livres afinal.".